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Por Altamiro Borges
A jornalista Keila Jimenez, da Folha, informa hoje que “o líder religioso Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de Deus, pode tornar-se proprietário de duas redes de TV”. O seu grupo já estaria finalizando a compra da rede CNT, por cerca de R$ 500 milhões. “Na semana passada, representantes do religioso estiveram no Rio negociando com dirigentes das Organizações Martinez, proprietária da CNT. A rede possui atualmente, entre emissoras próprias, retransmissoras e afiliadas, 48 praças que levam o seu sinal pelo país”.
Ainda segundo a jornalista, Valdemiro também negocia a compra de Rede 21, do Grupo Bandeirantes. “Locatária há quase cinco anos de 22 horas diárias no 21, a Igreja Mundial está acertando um novo contrato com a Band, que envolvendo o arrendamento do canal e, mais adiante, a compra com abatimento do valor já investido na emissora. O negócio gira em torno de R$ 700 milhões”. Para viabilizar estas milionárias aquisições, Valdemiro Santiago já tem pedido a cerca de 100 mil fiéis uma “doação emergencial” de R$ 200 cada.
As informações de Keila Jimenez são apavorantes. Atualmente, vários grupos religiosos já dominam boa parte da programação da tevê aberta no país. Esta invasão é perigosa e atenta contra a Constituição Federal, que fixa que o Brasil é uma nação laica. O Ministério das Comunicações, porém, não toma qualquer atitude. Depois do fato consumado, fica ainda mais difícil qualquer tipo de ação reguladora. Esta passividade não é por falta de aviso. Reproduzo abaixo excelente artigo de João Brant, do Coletivo Intervozes, publicado no Observatório da Imprensa.
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Em nome de Deus?
Por João Brant em 24/02/2011 na edição 630
Ligar a televisão no horário nobre e ver um líder religioso utilizando o espaço para pregar e buscar fiéis é algo que parece fora do lugar. E é. Não por ser uma manifestação religiosa, algo que é parte da cultura brasileira, mas por tornar evidente que um espaço público está sendo utilizado para fins privados.
O mundo todo discute como equilibrar os direitos à liberdade de expressão e à liberdade de crença, previstos em diversas Constituições, inclusive na brasileira. Há várias questões aí envolvidas. Primeiramente, manifestações religiosas devem ou não ser permitidas em veículos de comunicação que são concessões públicas, como rádio e TV? Se sim, deve ser permitido também o proselitismo religioso, ou seja, a prática de tentar "vender seu peixe" e conquistar fiéis?
Na busca de respostas, é preciso pensar como esse tipo de manifestação ajuda ou afeta a liberdade de crença – que é maior do que a liberdade religiosa e inclui até o direito de não se ter religião. E lembrar que, para outras manifestações similares, como o proselitismo político, já há um consenso sobre a necessidade de regras claras para que espaços públicos não sejam tomados por grupos específicos.
Apropriação indevida
No caso das religiões, deve-se perguntar, também, como garantir às distintas manifestações de fé o mesmo direito, já que não chegam a 2% as denominações religiosas presentes no Brasil que têm espaço em meios de comunicação. Deve-se também impedir que esses espaços sejam usados para ataques a outras religiões, como os que sofrem as denominações de matriz africana.
E há questões estruturais também fundamentais. Deve-se permitir canais inteiramente controlados por grupos religiosos, o que é proibido na maioria das democracias? Deve-se permitir o arrendamento de espaço – ou mesmo de canais inteiros – no rádio e na TV? Será que essa prática não configura uma verdadeira grilagem eletrônica, pela apropriação privada de um espaço público? Sejam quais forem as respostas, o nome de Deus não pode ser usado como álibi para evitar esse debate no Brasil.
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