BLOG O MURAL: Enganam-se os que equiparam o caso Demóstenes Torres ao revés sofrido
pelo conservadorismo brasileiro no impeachment de Collor há quase duas
décadas. O baque atual pode ser maior. Não pela importância intrínseca
de Demóstenes, mas pelo entorno histórico que cerca o streap-tease ético
do aspirante a novo salvador da pátria das elites nativas.
Collor renunciou ao final de 1992. No ano seguinte Bill Clinton
sucederia a Reagan na maratona desregulatória nos EUA. A
retroescavadeira neoliberal sacudiria o legado de Roosevelt por quase
dez anos (até 2001), sobretudo no sistema financeiro. A direita
brasileira, portanto, estava amparada ideologicamente no ambiente
internacional. Rapidamente ela se refez da queda do caçador de marajás
que ajudara a eleger (e como!). Seu dispositivo midiático agiu em duas
frentes. Reduziu o ex-herói à insignificância política de um personagem
que não estava à altura do seu enredo. Mas preservou o enredo,
encontrando um similar de Clinton para comandar as 'reformas' aqui: FHC
A gestão Democrata em Washington foi um lastro decisivo nesse processo.
Clinton não apenas incorporou o legado de Reagan (que por sua vez havia
replicado Tatcher), como aprofundou-o estendendo a desregulação e o
Estado mínimo à esfera bancária para pavimentar a supremacia das
finanças desreguladas. Não é retórica. A eliminação da lei Glass
Stegall, em 1999, liberou a formação dos grandes conglomerados
financeiros ao suprimir as barreiras criadas por Roosevelt, em 1933, que
separavam bancos de investimentos da banca comercial. A fusão dos dois
balcões num só permitiu aos financistas especularem com dinheiro alheio,
sem contrapartidas equivalentes.
O afrouxamento da supervisão estatal gerou o fastígio do crescimento sem
poupança, à base do crédito ilimitado. Foi um sucesso enquanto a
corrente se ampliava. A coisa desmoronou em 2008, com o estouro das
subprime. O resto é sabido. E o sabido foi tragicamente sintetizado no
suicídio de um aposentado grego, na semana passada. Ao tirar a própria
vida com um tiro, ele deixou um bilhete no qual exorta os jovens à luta
armada e declara sua recusa à opção cada dia mais coerente com a
persistência da lógica dos livres mercado: comer lixo. É nesse ambiente
ideologicamente abafado dos interesses conservadores que se dá o
streap-tease do aspirante a novo Collor dos Cerrados.
A mídia investia pesado na face do novo savonarola, lambuzando-o com o
glacê da 'direita preparada e linha-dura'. Abandonado agora à sarjeta
reservado aos que encerram elevado teor contagioso, o senador dublê de
contraventor escancara a indigência ideológica do projeto conservador
para o Brasil. Ao contrário do que se viu nos anos 90, hoje à crise
moral personificada no centurião goiano superpõe-se a assustadora deriva
de uma economia mundial em que o reiteração das ideias mercadistas
tornou-se sinônimo de
recessão e desespero. A margem de manobra estreitou-se a olhos vistos.
Quem se habilita a preencher o hiato com um salto progressista de
abrangência e profundidade equivalentes ao que representou o ciclo
neoliberal, nos anos 90? Esse é o ponto. Via blog contextolivre.com
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