BLOG O MURAL: A cada nova revelação sobre o esquema de formação de cartel que atuou no Metrô e na CPTM, em diversas administrações tucanas no governo de São Paulo, fica evidente que estamos diante de uma das mais graves denúncias de corrupção de que se tem registro - tanto pelo volume de recursos que foram desviados, segundo as investigações, quanto pelo envolvimento de autoridades públicas. Por isso, é preciso que a imprensa e a Justiça tratem o escândalo - que voltou à tona após delação da Siemens, uma das principais integrantes do cartel - de forma proporcional à sua dimensão, e não como um desvio de menor importância.
A revista "IstoÉ" trouxe novos detalhes sobre o esquema: a conexão franco-tucana. De acordo com as investigações da Polícia Federal e de procuradores, o propinoduto do PSDB que atuou na área de trens e metrô nos governos de Geraldo Alckmin e José Serra começou a ser desenhado ainda na gestão de Mario Covas, mas no setor de energia. Os investigadores apontam que a principal semelhança entre os esquemas, o que comprova sua interligação, é a forma como executivos da multinacional francesa Alstom pagavam propina a políticos e a pessoas com influência nos governos tucanos. Eles usavam empresas e contas bancárias em paraísos fiscais, consultorias de fachada e fundações - triangulações para apagar os rastros do dinheiro.
Mesmo antes dessa revelação, a gravidade e a extensão do propinoduto já estavam bem claras. A estimativa da PF e dos procuradores é de desvios da ordem de R$ 425 milhões de dinheiro público. Um absurdo. Mas também absurdo foi o tratamento que a investigação recebeu da grande imprensa. Com exceção da "IstoÉ", que em uma série de reportagens conseguiu expor a rede de interesses políticos que se beneficiou do propinoduto, os outros órgãos de comunicação se revelaram cínicos ou excessivamente tímidos na abordagem do caso.
Mal registraram a existência da investigação e só o fizeram quando forçados pelos fatos. Mas, ainda assim, dando mais espaço às insuficientes explicações do governo paulista do que às acusações em si. Os tímidos publicaram reportagens com revelações importantes sobre o esquema tucano, para que, à primeira vista, parecesse que estão cumprindo seu papel. Mas falharam em mostrar que esse escândalo não é apenas mais um episódio de corrupção descoberto Brasil afora. Ao que tudo indica, foi um dos maiores e um dos mais duradouros, tendo ocorrido no Estado mais rico do país, governado há 20 anos pelo PSDB.
O caso ainda está sob investigação? Sim, ninguém está pedindo uma condenação antecipada, como a mídia fez tantas vezes em relação a outros políticos e partidos. Mas não é por isso que não deve ser destacado que o vereador Andrea Matarazzo (PSDB), ex-secretário estadual de Energia, foi indiciado pela Polícia Federal por suspeita de corrupção passiva no inquérito que apura se, na década de 1990, a Alstom subornou políticos e servidores para obter vantagens em contratos com empresas do setor elétrico e de transporte controladas pelo governo paulista.
Indiciar significa acusar formalmente. Dar o devido destaque a essa notícia não é o mesmo que condenar antecipadamente o tucano. É reservar à notícia o espaço proporcional à sua importância no debate público. A mesma importância, aliás, que merece o registro de que Matarazzo e outros dez indiciados no mesmo caso tiverem o sigilo bancário quebrado por decisão da Justiça, para apurar se eles mantiveram contas bancárias no exterior entre 1997 e 2000.
Os órgãos de investigação estão cientes da gravidade do escândalo que têm em mãos. Resta saber se a imprensa vai acordar - e ver como a Justiça vai se comportar quando as apurações estiverem concluídas. Cabe a essas instituições garantir que um escândalo de tal magnitude não fique impune.
José Dirceu, advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT
No 247
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